Talvez pela admiração que sempre emprestamos aos nossos companheiros europeus, talvez pela efabulação dos relatos dos que, de nós, lá tentaram a vida, a verdade é que não escondemos a vergonha do nosso país e do ser português e usamos, sem pejo, expressões como: “isto é um atraso de vida”, “só aqui é que isto acontece” ou “a única solução é emigrar”, entre outras.
Porém, se é verdade que Portugal se encosta constantemente ao fundo do pelotão nas estatísticas europeias, não é menos verdade que os números não reflectem mais que os comportamentos dos cidadãos portugueses. Ou seja: ao contrário do que nos serve tantas vezes como desculpa, não é o país que condiciona a qualidade de vida dos cidadãos, mas os cidadãos que se abstêm da responsabilidade de melhorar a qualidade de vida no país. Isto revela-se nos vários campos da sociedade portuguesa e é o mote de várias notícias e crónicas sobre o caótico estado da nação portuguesa.
Disto, são paradigmáticos exemplos os artigos e reportagens dedicados à empregabilidade dos licenciados em Portugal, publicados regularmente na nossa imprensa. Entre estes, não há um que não aponte o desemprego como saída profissional da maior parte dos cursos superiores, sendo a medicina humana e a informática frequentemente apontadas como exemplos únicos de garantia de emprego.
Porque lemos e ouvimos estes números vezes sem conta, acabamos por interiorizá-los e acreditar neles como única verdade. Se antes a frequência universitária era entendida como suficiente para assegurar ao estudante um posto de trabalho tão bem reputado como remunerado, agora o ensino superior tende a ser visto como simples desperdício de tempo e dinheiro. Diz-se muitas vezes que por cá já não há lugar para “doutores”, diz-se muitas vezes que são demais.
Outros números, porém, mostram-nos que não reside aí o problema: afinal, o número relativo de licenciados em Portugal é bastante inferior ao da média europeia. E o mais estranho é que os nossos vizinhos europeus, apesar de terem mais licenciados que nós, são o destino profissional de muitos dos portugueses com curso superior.
Onde reside, então, a diferença entre nós e os outros países? Persistimos em olhar a universidade com os olhos das gerações que nos antecederam, entendendo-a mais como centro de emprego do que centro de formação. Esquecemo-nos de que é com a inovação que se dá o desenvolvimento e que é pela falta dela que os nossos parceiros europeus nos têm abandonado na cauda dos rankings.
A solução não passa, portanto, por prescindir do ensino universitário, mas trabalhar para a sua universalização, algo porque devem ser responsabilizados tanto o país como os que nele habitam. Se por um lado cabe ao estado garantir a igualdade de oportunidades no acesso à formação superior e à investigação científica, cabe também aos cidadãos reivindicar esse direito. Esta reivindicação deve passar pela aposta na formação superior que, mais que um direito, deve ser entendida como um dever cívico, já que a pouca formação dos nossos recursos humanos é a base da inabilidade que sentimos nas tentativas de superarmos os diversos problemas sociais.
O futuro do nosso mundo é o conhecimento e já perdemos presentes demais com olhos de passado.
publicado no jornal voz do trabalho, nº 583 (setembro/outubro)
escrito por by joão martinho Email post
« Home | as eleições autárquicas, parte dois » //-->
Posted by Fernando Castro Martins #
~Oo°~
eu também, parabéns, outra vez. *
Posted by Cláudia Faro Santos #
~Oo°~
Post a comment :