aconteceu num tempo que deixou de passar, num presente que congelou no mar picado pelo sol. o sol já caía para a noite e o azul começava a ver-se vermelho, laranja e roxo. houve mãos dadas e palavras de coragem, arrepios e suspiros; os primeiros de medo, os segundos de impaciência. ele tentava afogar-se numa areia que desejava movediça, ela desesperava para que ele, pelo menos, molhasse os pés.
depois dos calcanhares, os tornozelos, os joelhos e as ancas. assim, num ápice, tinha já a água pelo peito e os pulmões em choque. o mar enrolava tranquilo, o vento assobiava em paz, ela boiava serena e ele, prestes a desfalecer, agoniava ao sentir o coração em vertiginosa contagem decrescente.
"memória fotográfica", diz ele hoje em dia. "é que depois disso não me lembro de mais nada, como se o meu coração tivesse parado mesmo e ressuscitado já na praia. a minha memória seguinte é a da vontade de guardar a areia nos bolsos e a água nos olhos, quando acordei no areal. foi como se tivesse vivido o paraíso e, apesar de não o recordar, não querer perder essas memórias. por essa razão, nunca mais consegui chorar".
escrito por by joão martinho Email post
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~Oo°~
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