talvez não acreditassem no amor que se escreve por aí. perdiam-se, de olhos fechados, nos sonhos em que fugiam de mãos dadas. ele soprava no rosto dela e perguntava-lhe se sentia o frio gelar-lhe a cara: "chegamos, querida. dizia ali patagónia"; ela abraçava-o com força, embrulhava-se no cachecol dele e dizia-lhe: "tenho tanto frio". arrastava-o pela mão, corria até um sonho de mar, soprava no rosto dele e perguntava-lhe se sabia a maresia: "molhamos só os pés, anda"; ele apertava-lhe a mão com força, puxava-a contra si e sussurrava ansioso: "mas eu não gosto do mar". e de manhã, ainda deitados, escreviam e pintavam em verso o único receio que partilhavam: as manhãs de cama vazia.
não escreviam nem pintavam o amor em que se acredita por aí, talvez não soubessem a que sabe esse amor que todos vão encontrando por aí: as saudades não eram cócegas de borboletas na barriga, eram golpes a rasgar o estômago; os reencontros não eram a urgência nas corridas em câmara lenta, eram o cicio borbulhar do álcool ao queimar as feridas. um dia, quando ela lhe disse que já não acreditava no amor ele, em súbita asfixia vocabular, não soube sequer dizer-lhe adeus. de mãos nos bolsos, afastou-se enquanto mordia nos lábios a certeza de que esta história tinha sido escrita para adormecer nas palavras.
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este post termina a série iniciada no post .16. o conjunto dos posts pode ser lido aqui.
escrito por by joão martinho Email post
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~Oo°~
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